domingo, janeiro 07, 2007

Dissecar uma cultura num objecto

Moxi moxi? Não é preciso atender a chamada, para o keitai ser uma omnipresença nesta sociedade. O Japão é o líder mundial do objecto-embalador-dos-tempos-transitórios.

Numa carruagem de metro apinhada de falta de espaço, há ainda lugar para o ciberespaço. Todos estão ligados no modo silencioso, os telemóveis também. É o manner mode, o respeito pela comunidade, e em grupo aproveita-se o baixíssimo custo de envio de mensagens. Ou apenas se gasta tempo pelos botões.


Mata o vício dos jogos e da televisão, diz ao minuto se caem pingos de chuva, é o mais kawaii, toca música, faz de cartão de crédito, transporta porta-chaves girinhos, é Internet, guarda sentimentos. Os afectos cabem num pedaço de plástico.
É uma máquina territorial, capaz de transformar um comboio ou um elevador num espaço invisível de intimidade sem fios. O digital a servir o sentimental: as pessoas transportam no telemóvel as amizades, amores e outras (ainda potenciais) relações.

Num país de relações em deslocações, as ondas electromagnéticas são o refúgio para tédio e sono não atingirem as carruagens do metro. Muitos passageiros informam-se dos horários de transporte em pleno transporte, pelo keitai que acede à Internet. Fazem algo enquanto se deslocam, os japoneses muitas vezes vivem o instante seguinte antes do instante actual.
Daí a alienação na imersão tecnológica. Tocam os botões, acariciam-se, olham fixados para o objecto que isola, mas que protege do isolamento da sociedade exterior ao permitir movimentar-se pelo mundo nipónico com a toca de privacidade (é tamanha a importância do local que há autocolantes próprios para distorcer o aspecto do visor ao passageiro do lado).

É um modo de comunicar simples, rápido e privado. E que se pode adquirir por zero ienes (o meu foi um iene mais caro). Todos os modelos incorporam câmara fotográfica mas nenhum permite tirar fotografias sem que um som seja emitido. Assim todos podem ser testemunhas de um fotógrafo indecentemente carente.

A vida com esta tecnologia é tão natural que o keitai não é mais do que uma extensão do corpo, um ser essencial na cultura do Japão. E se o fenómeno acontece no país pole-position, pode ser esta forma de fervilhança magnética o futuro do Mundo.

Mais fotos, aqui.

1 Comments:

Anonymous Anónimo disse...

Meu Filho,

Do objecto propriamente dito, realço a possibilidade que me proporcionou, neste dia, de ouvir a tua voz, exactamente 25 anos depois do berro que anunciou a tua chegada.

Um beijo de parabéns, a muita distância, envolto em saudade,

Pai

Coimbra, 8 de Janeiro de 2007

9/1/07 5:00 da manhã  

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