quarta-feira, outubro 17, 2007

O maior assassino da Historia da Humanidade

(pontuacao... paciencia p.f.)


E tido como dado assente que o maior assassino da Historia da Humanidade usava bigodinho ao meio. Serio caso clinico, o Sr. Adolfo, no seu delirio ariano, achava-se no direito de moldar as mentes das suas gentes para gasificar seres humanos por nao considerar que estes eram dignos de viver, quer pela cor da pele, o tamanho do cranio, o local de nascimento ou religiao.


Admito que julgar e um mexerico cruel, e mais o e julgar quem matou mais, quem foi mais longe nas atrocidades, nas ilusoes das mentalidades. Apenas pretendo expor a Historia, a verdade.
E a verdade e que se a Gestapo cometeu crimes contra a Humanidade, o Exercito Imperial Japones cometeu a dobrar.

O Japao manchou a historia do sec. XX da maioria dos paises Asiaticos. Apos o termino da enclausura ao arquipelago subjugada as ordens do Shogunato, o novo Imperio procurou alargar o seu territorio. O que o Japao fez, foi, no fundo, uma mera copia dos movimentos ja efectuados em epocas passadas pelas restantes potencias internacionais.

Acreditanto que o solo japonês era sagrado, que nao merecia a presenca dos barbaros forasteiros, “inferiores a sua raça”, lancaram-se ao exterior, navegaram para o horror: Guerra Sino-Japonesa, Guerra Russa-Japonesa, Primeira e Segunda Grandes Guerras. Alem dos territorios referidos, China e Russia, o Japao dizimou inocentes – civis e militares (os militares nao sao tambem inocentes?) – nos territorios da Coreia, Filipinas, Indonesia, Mianmar, Singapura, Hong-Kong e Malasia.

O Massacre de Nanking e um exemplo documentado do leque de insensibilidades: experiencias em corpos humanos, enterro de pessoas vivas, tortura de prisioneiros de guerra, canibalismo, trabalho forcado, violacoes.
Palavras do historiador C. Johnson: Podera nao fazer sentido tentar definir qual foi o agressor mais cruel da 2GGuerra, se o Imperialismo Japones, se o Nazismo. Ambas as nacoes destruiram os paises que conquistaram numa dimensao monumental; no entanto, as barbaridades cometidas pelo Japao foram mais, e durante um periodo maior, que as dos Nazis. Ambos assassinaram e escravizaram milhoes, exploraram-nos como trabalhadores forcados – e no caso dos japoneses, como prostitutas forcadas para as tropas da linha da frente.

Uma das razoes que explica o comportamento selvatico das tropas niponicas foi o tratamento extremo imposto durante a formacao militar. Tal tratamento incluia uma lavagem cerebral. Os soldados japoneses passavam a acreditar que o inimigo era um barbaro que iria violar as suas familias e que mataria todos os prisioneiros de guerra. Para o soldado niponico era uma honra morrer pelo Imperador, como para o samurai era uma vergonha nao morrer pelo seu amo.
Esta ideia fabricada nas mentes de muitos jovens japoneses incitou a morte de muitos deles. Os Kamikaze, como ja referi neste espaco - nao eram suicidas mas sim vitimas da obediencia; por outro lado, milhares de soldados da infantaria suicidavam-se antes de serem capturados – e assim poderem ser salvos da demencia – pelos soldados americanos ou asiaticos. E facil concluir, mas nao devo deixar de resumir, que isto significa que o Exercito Imperial Japones ordenava as suas tropas a morte do inimigo, e ainda matava as suas proprias tropas.

Obviamente que o sentimento de remorso percorrera durante eras as gentes do Japao. Ha, pelo mundo fora, sobreviventes da Segunda Grande Guerra. Nao foi ha assim tanto tempo. E e admiravel que num pais que tem no seu curriculo recente este perfil de violencia, se vive actualmente numa harmonia inimaginavel comparativamente a outros lugares que nunca fizeram parte de guerra entre nacoes.
Pede-se muitas desculpas pelo vexame japones no sec. XX, pede-se muitas desculpas, pede-se sempre desculpas. Acho possivel que este repetitivo sentimento de culpa do Japao contemporaneo tenha sido em parte desencadeado pela imagem deixada pelos infames crimes de Guerra na consciencia moral do povo japones.

Mas nao se deixe enganar quem le estas linhas, pois nao e minha intencao concluir desta exposicao que o maior chacinador da Historia foi o Imperio Japones. Nao se deixe turvar pelos preconceitos. Eu ajudo: some-se as centenas de anos de perseguicao heretica e inquisicao presentes na cronologia da dita Humanidade, e nao se espante em descobrir que o maior assassino da Historia foi a Igreja Crista.
Vil ironia, pois a ironia e quase sempre negra, de a cruz crista, onde esperou a morte Jesus Cristo, se ter tornado um simbolo armado, um culto de opressao psicologica. E que com a crucificacao de Jesus Cristo, morreu tambem um dos ensinamentos que o mesmo defendia: Não matarás.

terça-feira, outubro 16, 2007

A multiplicidade do Hai

(ao telefone)

Moxi-moxi? Estou sim?
Ha, hai! Ah, ola!
Hai... Sim...
(pausa)
Hai. Estou a ouvir.
(pausa)
Hai? O que?
Hai, hai. Ah, ok, ok.
Hai! Entendi.
Haaaai. Adeus, vou desligar.

sábado, outubro 13, 2007

De outra perspectiva

(nada a fazer em relacao a pontuacao...)

Vizinho do arquipelago japones, tomo nota mais facilmente das diferencas descomunais que existem entre o Japao e a Asia, entre o Japao e o Mundo.
Nessas diferencas, obviamente, existem vantagens e desvantagens.
As vantagens sao todas as situacoes que me recalcam a infancia. Volto a ter a oportunidade de fazer amigos em poucos instantes, de saber se a pessoa gosta de mim ou se nao esta contente por me ver, de ver em cada farda uma pessoa, de entrar no café e ver a empregada a cantarolar a musica na radio; de poder comer ao ar livre; de me fazerem perguntas porque querem saber as respostas; de brincar com as criancas; de voltar a entender o que se passa a minha volta; de voltar a sentir o que se passa a minha volta. Enfim, volto a ter aquilo que me e natural, aquilo em que nasci. (porque os filipinos sao os latinos da Asia)

As desvantagens, tal como as vantagens, sao tambem muitas e gritantes. Concentrar-me-ei em duas delas, sob o tema da disciplina.

Principalmente nas cidades de Osaka e Toquio, ha um numero de muitos zeros de vagabundos, moradores de rua, ou outro eufemismo qualquer. Mas no Japao estas pessoas nao mendigam. Nao estendem a mao. Porque da mesma forma que nao querem ser incomodados enquanto leem os seus livros ou varrem o seu espaco de chao, tambem nao incomodam os transeuntes com o maior acto de humilhacao perante o capitalismo.
(Nas Filipinas, so durante a estadia na miseria da capital e que me pedem dinheiro. Eu digo sempre que nao. Uma moeda, duas moedas: se nao lhas dou nao morrem de fome; se lhas dou a vida de rua continua. Mendigar nao os tira de onde estao. E os vagabundos japoneses sabem-no.)
Por outro lado, e sem acreditar que esteja obrigatoriamente ligado ao sub-desenvolvimento, esta a questao do lixo. Um dos gestos que mais me surpreende sempre que deixei o territorio japones e ver pessoas a deitar lixo para o chao. O Japao e dos paises que mais lixo produz, mas os seus residentes colocam-no no lugar devido. E algo que se tornou tao natural para mim que me esquecera que muitos paises do mundo se parecem uma grande lixeira. E porque? Nao e porque nao haja caixotes do lixo, porque no Japao tambem nao os ha! E por falta de disciplina. E a disciplina nasce na educacao
(as criancas japonesas sofrem... mas por sofrer desde rebentos, suportam mais no futuro)

Antes achava que nao valia a pena lutar contra o flagelo do lixo. Que era um esforco inglorio. Pensava deste modo: se eu me preocupar com o lixo, mas se mais ninguem se preocupar com o lixo, o mundo vai continuar sujo.
Ha uns anos atras, mudei de ideias: ha sempre tempo de mudar.
Nao quero saber dos outros, ponho o lixo no lugar (ponho sempre e todo o lixo no lugar); nao deito a beata ao chao; nao me vingo do recibo deitando-o ao chao.

Se a populacao do mundo pensar como eu pensava antigamente, o mundo sera cada vez mais uma imundice. Se pensar como eu penso agora, sera um lugar limpo, um lugar de respeito para com os outros, para com o mundo, logo para com o proprio individuo.
Um lugar que de tao limpo muitos nao acreditam poder existir.
Quando cheguei ao Japao, confirmei que e possivel a existencia desse lugar. As pessoas levam consigo o lixo que fazem, guardam as beatas em cinzeiros portateis. Porque afinal o lixo nao e da terra, o lixo e de quem o faz.
Quem nao acredita que e possivel e porque ainda nao visitou o Japao.

quinta-feira, outubro 04, 2007

Migração

(com erros de ortografia e pontuacao)





Não fazia ideia do quanto necessitava de ferias.
Descansar do trabalho, da metropole, da cultura japonesa. Parar.
Toquio absorve-me. Esqueco-me do resto do mundo. E estar noutra dimensao. Esqueco que o mundo deixa criancas morrer a fome, e eu faco parte desse mundo.
Em Toquio os minutos sao contados e a vida passa ao correr de cada minuto. Dou importancia ao tempo e ele esgota-se em mim. E assustador.
A cultura japonesa seca-me. Trabalhando e convivendo com japoneses torno-me eu tambem num bonsai. Amarrado as regras e a exigencia de harmonia.

Uma semana de ferias nas Filipinas facultou-me espaco e tempo – esse matrix onde achamos que respiramos. Sozinho e em silencio, caminhando na praia olhando o inacreditavel oceano, pude observar-me. Distanciei-me do meu eu no Japão e analisei-me: viver em Kagurazaka e confortavel. Habituei-me. Cai na rotina em Toquio.

Estou pronto a voltar ao Japão para mais um periodo de trabalho e olho no relogio. Levo apontado, como sempre, memorandos. Recados para mim proprio. Se tu proprio. Fala ingles sem usares o sotaque japones. Nao des tanto de ti, porque um ramo do bonsai sera cortado. Tenta distanciar-te e estar consciente dos actos. Sorrir. Disciplina. Gastar menos dinheiro em alcool. Continuar a respeitar os outros. Deixar-me ir.

Deixo-me ir…
2 de Outubro de 2007, Aeroporto de Narita 13:00
Aterro. Aos primeiros passos no aeroporto volto a escutar a tranquilidade do silencio (que no Japão tanto diz). Proxima etapa, burocracia. O poder dos governos. Uma obrigação, ou nao seremos cidadãos. Deixo-me ir.
Hesitam em carimbar o passaporte. Perguntam-me porque escrevi na ficha de desembarque que pretendo ficar por dois anos se nao tenho visto de trabalho. Explico que uma empresa me vai facultar o visto e quando o tiver inicio o trabalho. E estranho mas e verdade: ao mesmo tempo estou a mentir (porque ja trabalho para essa empresa) e a ser honesto (a empresa ia mesmo patrocinar o meu visto e assim ficaria legal).
- Devia ter emitido o visto antes de vir. , dizem-me do outro lado do balcão.
Sou levado para uma sala onde preencho um questionario em portugues. Extenso e detalhado. (Bem-vindo ao Japão )
Espero e espero. Pelo tempo e pelo sim.


Não.


O senhor da Imigração não me olha nos olhos (Bem-vindo ao Japão). Fala para o tradutor observando as suas proprias mãos. As palavras saem-lhe confiantes, e a cara so expressa trabalho. E implacavel. Frio.
- O problema de teres vindo sem visto nao e meu. O erro foi teu. Nao te posso deixar entrar. Fazes o visto e depois podes entrar.
Não aceita que lhe de explicaçoes pois sabe que não vão mudar nada. Nao me da qualquer hipotese de argumento nem permite a ele proprio qualquer relance de sentimento.
Da-me a escolher: aceitar a decisão ou recorrer ao Ministerio da Justiça (O poder dos governos).
Eu sou um reinvindicador por natureza. Reinvindico de mim proprio e sem saber porque.
Nesta situacao controlo as emoçoes e raciocino com pragmatismo. Sei bem o que significa um Não no Japão.

Sinto-me um criminoso (cometi um crime auto-infligido contra o meu proprio caminho). Tenho escolta pessoal e nao posso sair de uma area restricta do aeroporto. Onde estou? E a primeira vez que saio de um lugar onde nao cheguei a entrar.

A decisão mais barata e deixar o Japão nesse mesmo dia. Para onde? O dinheiro e um problema. Não tenho o suficiente para voltar a Portugal. Nem dinheiro nem vontade. Não e desta forma que quero regressar.





Voo novamente para a proximidade das Ilhas Filipinas. Vou esperar a burocracia.
Subita e forçadamente abandono o trilho por onde seguia. Mas o tiagointokyo continua a existir. E em Toquio que esta a minha casa, a minha roupa, as minhas camaras, os meus projectos. Eu estou la. Fui apenas deportado, transladado de mim temporariamente.


Em Manila, onde escrevo estas linhas, continuo zonzo do episodio. Ainda nao o digeri.
Espero que o tempo turve a memoria e anestesie o sentimento.

Eu nunca fui esbofeteado. Nao acredito na violencia por isso nunca levei um murro na cara. Sinto, embora, que deve doer muito menos do que a maneira como o Japão nos bate. Sem emoçoes e sem musculo. Nem sequer me tocou mas atingiu-me com muito mais violencia.



(PS: Continuarei a escrever regularmente sobre o Japão, infelizmente, sem a forca complementar das fotografias. Mas uma vantagem: estar distanciado)