quarta-feira, janeiro 31, 2007

Provérbio japonês

Dar à luz um bébé é mais fácil do que se preocupar com ele.

terça-feira, janeiro 30, 2007

Máquinas de venda nos olhos

No arquipélago de 127 milhões, o delírio consumista não escolhe horas nem ruas nem passeios: existe uma máquina de venda automática por cada 23 habitantes. E mesmo em inferioridade, as máquinas não são vandalizadas.

A maioria vende bebidas a pouco mais de 100 ienes, numa diversidade de oferta colossalmente inversa ao homogéneo génio nipónico. Mas flores, ovos, cigarros e gelados também estão ao alcance de botões.

Não deixo de ser dominado pelas marcas. Conforme o dia e a máquina, escolho um café que me inspire ou me dê fogo.
Até nas latinhas de café o Japão absorve as pessoas de imagens superficiais.

Mais fotos, aqui.

segunda-feira, janeiro 29, 2007

Nem mais um segundo

Faltam dez minutos para o Shinkansen iniciar a viagem a mais de 300km/h.
Empregadas uniformes aguardam pela limpeza supersónica das suas funções. Passageiros ordeiros nos locais que demarcam as carruagens da locomotiva. Em breve a porta 14 estará milimetricamente à frente dos que esperam a carruagem 14.

O comboio-bala ainda não está na plataforma da Estação de Tokyo.

Mais um dia na prática das tarefas. Até os passageiros trabalham para o maquinismo formigueiro da cultura. Higiene ao milímetro, eficácia ao segundo.
À hora certa a bala partiu.

domingo, janeiro 21, 2007

Women Only

À hora de ponta no metro de Tóquio começa mais um dia de transporte como sardinha enlatada.

Depois de muitos obscenos comportamentos japoneses, que se aproveitam do espalmar dos corpos para consultar a tacto as finas nipónicas, engendraram-se carruagens unisexo.

Por este descontrole de hormonas dos chamados chikan, os homens começam a ser negados também em outros locais, como lojas e restaurantes.

Mas no fim do dia de trabalho, e de volta à sardinhada, deixa de existir a exclusividade feminina nas carruagens, e chikans como o célebre Homem do Espelho voltam a ter oportunidade para o apalpo.

quinta-feira, janeiro 18, 2007

Certificado de Alienígena

Os forasteiros são carimbados como aliens no país que existe noutro planeta.
É obrigatório o registo como alienígena, para ter como identificação pessoal o Certificate of Alien Registration Card.
O mergulhar de extravagância japonesa deturpou a minha consciência, pois só muito Japão depois é que compreendi: não é o Japão que é estranho para mim, eu é que lhe sou estranho. Tenho Certificado de Alienígena e vivo rodeado de terráqueos nipónicos.


quinta-feira, janeiro 11, 2007

Sinal vermelho à irreverência

Não se escuta um motor, não se avista um condutor. Numa rua oca de tráfego, os japoneses adiam a vida enquanto o Deus-ampulheta do urbanismo não esverdear.
O superior diz, o japonês obedece.

Sei que um carro invisível não atropela e a minha luso-impaciência avança criminosa. A meio da passadeira sorrio, quando uma ou outra alma nipónica conclui algum bom senso na minha rebeldia, e comete o delito também.

O Japão é um universo de cópias, até de sensatez.


segunda-feira, janeiro 08, 2007

A chegada da idade

Não posso ser um explorador nato depois de querer ficar na barriga da minha mãe.
Faz hoje 25 anos que não quis entrar neste Mundo.

Mas não é por isso que é feriado nacional no Japão e as meninas de 20 anos vestem o kimono. É a Chegada da Idade, Seijin no Hi, comemorada pelos novos homens e mulheres. A teoria diz que já podem votar, beber, fumar. Aos 20 é-se adulto.

Aos 25 ainda não. Chego à idade todos os dias.

domingo, janeiro 07, 2007

Dissecar uma cultura num objecto

Moxi moxi? Não é preciso atender a chamada, para o keitai ser uma omnipresença nesta sociedade. O Japão é o líder mundial do objecto-embalador-dos-tempos-transitórios.

Numa carruagem de metro apinhada de falta de espaço, há ainda lugar para o ciberespaço. Todos estão ligados no modo silencioso, os telemóveis também. É o manner mode, o respeito pela comunidade, e em grupo aproveita-se o baixíssimo custo de envio de mensagens. Ou apenas se gasta tempo pelos botões.


Mata o vício dos jogos e da televisão, diz ao minuto se caem pingos de chuva, é o mais kawaii, toca música, faz de cartão de crédito, transporta porta-chaves girinhos, é Internet, guarda sentimentos. Os afectos cabem num pedaço de plástico.
É uma máquina territorial, capaz de transformar um comboio ou um elevador num espaço invisível de intimidade sem fios. O digital a servir o sentimental: as pessoas transportam no telemóvel as amizades, amores e outras (ainda potenciais) relações.

Num país de relações em deslocações, as ondas electromagnéticas são o refúgio para tédio e sono não atingirem as carruagens do metro. Muitos passageiros informam-se dos horários de transporte em pleno transporte, pelo keitai que acede à Internet. Fazem algo enquanto se deslocam, os japoneses muitas vezes vivem o instante seguinte antes do instante actual.
Daí a alienação na imersão tecnológica. Tocam os botões, acariciam-se, olham fixados para o objecto que isola, mas que protege do isolamento da sociedade exterior ao permitir movimentar-se pelo mundo nipónico com a toca de privacidade (é tamanha a importância do local que há autocolantes próprios para distorcer o aspecto do visor ao passageiro do lado).

É um modo de comunicar simples, rápido e privado. E que se pode adquirir por zero ienes (o meu foi um iene mais caro). Todos os modelos incorporam câmara fotográfica mas nenhum permite tirar fotografias sem que um som seja emitido. Assim todos podem ser testemunhas de um fotógrafo indecentemente carente.

A vida com esta tecnologia é tão natural que o keitai não é mais do que uma extensão do corpo, um ser essencial na cultura do Japão. E se o fenómeno acontece no país pole-position, pode ser esta forma de fervilhança magnética o futuro do Mundo.

Mais fotos, aqui.