Não sei quantas horas passei em autêntico transe digital a ver o vídeo do jantar final do Curso de Gestão Internacional, quando os estagiários, um a um, ficaram a saber o destino do estágio.
Quando entro em cena, martirizado depois de oito dias ansiosos e
martinizado depois de oito copos nervosos, observo como peço inquieto ao Prof. Alberto Castro, orador da noite, por
“Sítios exóticos, sítios exóticos!”. Diz-me:
“Pá, você vai para o ICEP, já é um sítio exótico”. Vejo-me a pôr as mãos na cabeça, ao lado de dirigentes do ICEP. Reajo. Depois conclui: “
E você vai mesmo para um sítio exótico, você vai para o Japão”. Observo como volto as costas, agito as mãos, saio da sala. Reajo.
É-me impossível explicar aquelas reacções. Não consigo entender-me agora que me vejo sob o olhar supremo do registo fílmico. E ponho-me a reflectir sobre se é possível teorizar a posteriori sobre uma reacção individual. Não sei.
“Chile. Ou Cabo Verde”. Era esta a resposta que dava quando me perguntavam para onde sonhava eu ir no Programa Contacto.
O Chile sempre foi uma perdição. Desde a veneração inocente da Ilha da Páscoa à luta ciberespacial por um “Erasmus” em Santiago do Chile, e todo um continente de sangue latino por descobrir numa viagem
Poderosa. Cabo Verde é uma paixão que me invadiu o inconsciente depois de uma quinzena veraneante. O sorriso das crianças da Praia é uma perigosa endemia contagiosa.
Dois lugares de povos terra a terra, pobres de carteira, ricos de espírito. Agora que me interpreto a mim próprio, talvez quisesse saber como dar à vida simplicidade e receber simplicidade em troca, aprender como ser simples, ou tentar aprender a ser feliz, ou tentar aprender a ser feliz sendo simples. Não sei.
Mesmo sendo formalmente um estágio internacional, para mim o Contacto nunca deixou de ser um voo internacional, uma viagem sonhada, uma oportunidade única de sentir uma cultura antípoda.
Tinha feito uma lista mental de cinco países, que incluía o Japão.
Sítios exóticos… O Japão é dos lugares mais exóticos do mundo, porque é, aos olhos portugueses, diferença, choque, extravagância. Consumismo desenfreado, multidões ordenadas, formalismo rigoroso, tecnologia futurista. Muito pouco terra a terra. Mesmo ricos de carteira, os japoneses são ricos de espírito, espero confirmar.
Não me vejo agora a trocar Tóquio pelo Chile ou por Cabo Verde. Sei que se pudesse trocar, não o faria. Explicar porquê, não sei.
É a experiência extravagante que me espera que pesou na minha decisão de ter um espaço virtual - o blog - em que perpetue aquilo que vou ver e sentir. É também uma obrigação que faço a mim próprio, a de escrever uma vez por semana para o blog, a contar em palavras e em fotografias quão perdido vou andando pela cultura japonesa, mas também a contar uma viagem de exploração interior.
Outra razão óbvia é que usando as expressões orais coloquiais do português das noites jovens como “
tipo”, “
cena”, “
coisa”, “
na boa”, “
brutal” ou “
curti bué” não ia nunca conseguir descrever devidamente à família, amigos, conhecidos e desconhecidos, as peripécias porque passarei. Além de tudo isto, confesso que a viagem sonhada que fiz paralelamente à viagem de Gonçalo Cadilhe e os seus artigos na revista “Única” motivaram-me para continuar a busca anti inércia e a “
fuga para a frente”, que persiste dentro de mim desde os meus quinze anos, altura da minha primeira viagem interculturas.
Obviamente, nunca colocarei os textos do blog à frente dos afazeres profissionais na delegação do ICEP, onde vou estagiar. Mas quero, mesmo assim, cumprir a promessa semanal. O tempo logo dirá se o vou cumprir. Eu, por agora, não sei.
Que venha o exotismo do Japão. Mal posso esperar. Mês de Abril, mês da Liberdade, mês de libertar-me do meu país pelo máximo período de tempo desde há 24 anos, quando chorei pela primeira vez.
Quando voltar, mal vou poder esperar pelo próximo estágio cultural.
“
Chile. Ou Cabo Verde”. Em qual
estagiarei primeiro? Não sei.